domingo, setembro 11, 2011

-um poeta e seu poema mudo, resta seu grito: impotente - vazio!

_ imponderável_



o vento arrasta os lixos noturnos

leva nas suas asas versos de sangue-sujos

e, a poesia chora as vergonhas do  mundo



deus anda, desanda e vem

pelas ruas de uma noite comprida

a reter o dia novo entre seus desígnios

assim como faz com a prometida redenção em cristo



uma criança geme na calçada com  febre, fome e frio

com seus olhos já gastos a mirar ocasos sem abrigos



homens crucificados nas esquinas e  marquises

dormem como sobras de ontem, restos da vida:

-sina?




os carros passam em disparada

escarram no asfalto, cospem no meio fio

as bocas de enormes latas de lixo são reviradas

por baratas, por ratos, pelas unhas dos mendigos



mas, deus caminha ereto com seus passos de rei perdido

pela madrugada torta,  sobrevoa meio alamedas desertas



sob as luzes de neon folheia as noticias do amanhã:

- prostitutas e gays serão assassinados na avenida atlântica

- mulheres estarão a parir natimortos nos hospitais sem portas

- prantos permanecerão jorrando por mil mortos nas veias de áfricas

- alcateias de ladrões à espreita preparando-se para matar novos turistas

- acordos sobre o fim das bombas nucleares firmados com letras d’águas




ele sabe, ele conhece, ele escuta, mas permanece esquecido

o vento junto com os lixos noturnos arrasta sonhos perdidos


resta:

-um poeta e seu poema mudo, resta seu grito: impotente - vazio!

  

nAanadeabrãomerij

3 comentários:

  1. Impassível é como vejo....quem?
    Bjs
    Bel

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  2. Um poema denso- pleno de verdades .Bem conseguido. Parabéns!

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  3. Em pleno século XXI, "(...) as bocas de enormes latas de lixo são reviradas/por baratas, por ratos, pelas unhas dos mendigos (...)", há inúmeros regimes corruptos, as organizações internacionais estão mais preocupadas com interesses económico-financeiros do que em salvar a vida de milhões de pessoas que morrem de fome no Nordeste Africano e noutras partes do mundo... Por isso, o grito-denúncia do Poeta torna-se cada vez mais urgente e necessário. "(...) Por isso recomeço sem cessar a partir da página em branco/E este é meu ofício de poeta para a reconstrução do mundo" (Sophia de Mello Breyner).
    Parabéns, Ana Merij, pela contundência dos seus Poemas e pela legibilidade que não se opõe à qualidade.

    Um abraço
    Maria João Oliveira

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Obrigada!
nanamerij